Semana da Pessoa com Deficiência Intelectual e Múltipla busca maior consciência sobre o potencial das pessoas
Publicado em: 04/08/2025
Por Sergio Gomes para o site da Câmara Paulista de Inclusão
Se não podem aprender da forma como ensinamos, ensinaremos da forma como aprendem–Ole Ivar Lovaas.”—Psicólogo e pesquisador norueguês.
No mês de agosto, dos dias 21 a 28, é celebrada a Semana da Pessoa com Deficiência Intelectual e Múltipla, a semana foi instituída oficialmente pela lei nº 13.585 em 2017, mas é celebrada desde 1964, como instrumento para combater a discriminação, o preconceito e a exclusão das pessoas com essas deficiências. O evento é organizado pela Federação Nacional das Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (Fenapaes).
De acordo com Flávio Gonzales, coordenador de inclusão social do Instituto Jô Clemente, “A reunião da pessoa com deficiência intelectual e múltipla nesta mesma semana não é sem razão, uma vez que muitas das pessoas com deficiência múltipla, embora não todas, têm a deficiência intelectual associada a outra deficiência, frequentemente física.” Gonzales completa comentando sobre a institucionalização e a segregação a que esse público esteve submetido ao longo da história, além, claro, da marginalização social a que também são submetidos até os dias atuais. “A importância da semana está na reafirmação do seu direito à plena participação social, conforme previsto na Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e Lei Brasileira de Inclusão, visando proteger seus direitos, promovendo a igualdade e a não discriminação” completa Flavio Gonzales.

Mitos sobre trabalho e PCDI
Entre os vários mitos que rondam o universo das pessoas com deficiência e também o da inclusão, principalmente quando se fala em pessoas com deficiência intelectual, o mito mais comum é de que elas não são capazes de aprender, e caso sejam incluídas no ambiente laboral, serão apenas favorecidas por alguma política pública ou ação afirmativa, mas pessoas com deficiência intelectual são capazes de aprender, talvez precisem de mais tempo de treinamento e também de mais adaptações didáticas, mas com o suporte adequado aprendem e podem desempenhar funções produtivas no ambiente de trabalho. “A inclusão de pessoas com deficiência intelectual e múltipla no contexto corporativo, transforma o ambiente e a cultura das organizações por representar aspectos da diversidade humana que frequentemente são ignorados em decorrência do capacitismo estrutural de nossa sociedade. Sua presença nas equipes de trabalho reverte-se em ganhos de produtividade, melhor clima organizacional, além de contribuir para que líderes e pares estejam mais bem preparados.” explica Gonzales.
Dispositivos de apoio
Hoje, o principal instrumento de inclusão das pessoas com deficiência no mercado de trabalho é a lei 8.213/1991, conhecida como “Lei de Cotas”, que no último dia 24 de julho completou 34 anos. Embora a lei de cotas seja um importante dispositivo de inclusão a lei não é respeitada por muitas empresas e uma das maiores barreiras ao bom funcionamento desse recurso são as inúmeras barreiras que as empresas colocam para a contratação de pessoas com deficiência e as barreiras atitudinais talvez sejam as maiores, alimentadas pelos mitos mencionados anteriormente. Apenas a contratação não promove uma verdadeira inclusão quando não vem acompanhada de um ambiente onde o profissional se sinta bem e encontre estímulos e oportunidades para o desenvolvimento profissional, onde se sintam valorizados, e tenham suas necessidades, particularidades e habilidades respeitadas.
Hoje em dia, diversas pesquisas feitas por instituições como a ONU e a OIT(Organização Internacional do Trabalho) mostram os benefícios de incluir pessoas com deficiência no ambiente de trabalho. Entre esses benefícios, estão a melhora no clima organizacional e o fato de equipes mais diversas geralmente serem mais criativas e inovadoras na hora de resolver problemas profissionais. “O Instituto Jô Clemente (IJC) tem realizado cerca de 500 inclusões por ano, contabilizando mais de 5 mil inclusões nos últimos 10 anos, com taxa de 93% de retenção. Isto contribui efetivamente para que as empresas tenham a oportunidade de ter equipes mais diversas e produtivas, reduzindo as desigualdades, as discriminações, a pobreza, a segregação e a exclusão” diz Gonzales.
A inclusão das pessoas com deficiência, incluindo pessoas com deficiência intelectual e múltipla, nos quadros das empresas melhoram a imagem que a empresa tem no mercado, já que empresas inclusivas são vistas como socialmente responsáveis e isso contribui de diversas formas positivas, podendo atrair novos talentos, clientes ou investidores.
Instrumentos e recursos que auxiliam na inclusão
A contratação de pessoas com deficiência intelectual e múltipla no marcado de trabalho não é apenas uma oportunidade para que essas pessoas conquistem independência financeira, embora esse seja um aspecto muito importante. O emprego oferece à pessoa com deficiência um senso de propósito, aumentando a autoestima e contribuindo para a conquista de autonomia, o que possibilita a plena participação social dessas pessoas.
Um dos recursos mais utilizados para garantir uma inclusão efetiva e sustentável é o método do emprego apoiado e Flavio Gonzales explica melhor esse processo: “É um método internacionalmente reconhecido, do Emprego Apoiado, [é]uma prática baseada em evidências adotada pelo Instituto Jô Clemente (IJC) desde 2013 e que é, inclusive, uma política pública em diversos países no mundo, é, sem dúvida, o melhor instrumento para uma inclusão efetiva e sustentável.” O emprego apoiado é composto por três fases que garantem sua eficiência “a partir da descoberta do perfil de cada pessoa, desenvolvimento de emprego e acompanhamento pós-colocação, teremos a certeza de que a pessoa está realmente incluída, em um ambiente diverso e acessível, recebendo o apoio que precisa, e não simplesmente contratada. Contratar por si só nem sempre significa incluir, embora seja um passo importante” completa Gonzales.
Desafios na contratação e na integração
Ainda existem muitos desafios para a contratação de pessoas com deficiência intelectual nas empresas, como falta de preparo das empresas para receber esse público, dificuldade para adaptar de forma eficiente processos seletivos, ausência de programas de treinamento adequados, pois muitos profissionais de Recursos Humanos e também gestores não têm conhecimentos adequados sobre deficiência intelectual, suas potencialidades e adaptações necessárias.
A sociedade como aliada
A sociedade tem um papel importante em ajudar a incluir pessoas com deficiência intelectual ou múltipla, criando ambientes mais saudáveis e acolhedores para elas. Esse processo pode começar ainda na infância, com crianças convivendo na escola com colegas que têm essas deficiências, por meio de uma educação inclusiva. Essa inclusão também acontece no trabalho e em várias outras áreas da vida social. Quanto mais convivemos de verdade com essas pessoas, mais conseguimos entender e acabar com preconceitos. Não há outra maneira de combater a discriminação além do contato real. Educação, informação e conscientização são essenciais, mas é nas relações do dia a dia que aprendemos a valorizar cada pessoa pelo que ela é, sem rótulos e estereótipos.
Mensagem de Flavio Gonzales para a sociedade e empresas
É um princípio fundamental, consagrado na Declaração Universal dos Direitos Humanos, a afirmação de que “todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos”. O Instituto Jô Clemente (IJC) vem há 64 anos lutando neste sentido, pela inclusão das pessoas com deficiência intelectual e múltipla, por meio da prevenção e promoção da saúde, da defesa e garantia de seus direitos, produção e disseminação de conhecimentos sobre sua condição e sua realidade. Nossa mensagem é um convite para que toda a sociedade brasileira e comunidade internacional estejam conosco nessa luta, que é uma luta de todos nós e por nós, pois trata-se de construir um mundo mais justo para todas as pessoas.