Peritos do INSS são denunciados por criar barreiras ao acesso a direitos de pessoas com deficiência

Publicado em: 25/07/2022


Mesmo que as famílias procurem o Ministério Público e isso venha a frear a perícia médica novamente, famílias já foram lesadas. Pessoas já tiveram seu atendimento recusado. Já tiveram seu atendimento reagendado lá para a frente. Isso, se mudar na semana que vem essas famílias não vão ser atendidas na semana que vem, porque não vai ter vagas para elas na semana que vem.”

No dia 22 de julho a Câmara Paulista de Inclusão recebeu uma denúncia vinda de uma fonte de dentro do INSS, e que aceitou falar sobre a condição de anonimato. A pessoa com quem conversamos relata uma série de problemas, por parte principalmente dos peritos e da ANMP (Associação Nacional dos Médicos Peritos).  Segundo a fonte, por conta de uma nova portaria DIRBEN/INSS n. 1.036/2022, que altera a Portaria DIRBEN/INSS n. 982/2022 está causando muitos transtornos, em especial para as crianças com deficiência, pois elas estão tendo seus atendimentos negados por não possuírem um documento de RG. A fonte frisa que hoje, as crianças já saem das maternidades com a Certidão de Nascimento, documento que tem fé pública, e que hoje também já conta com o número do CPF e que deveria ser suficiente para identificar as crianças com deficiência.

“Em 2017, quando teve um decreto que alterou o ornamento do BPC, a gente passou a ter uma avaliação biopsicossocial para avaliar as pessoas com deficiência e, inclusive, foram contratadas assistentes sociais para a instituição. Aí a gente passou a ter um instrumento de avaliação, e a gente vem vivenciando diversos episódios perante a perícia médica. Desde dificuldade na condução do processo de atendimento das pessoas que fazem o pleito do BPC, por uma resistência do próprio perito, porque na visão de mundo dele, ele acha que esse benefício não deveria existir, que as pessoas não trabalham e não contribuem, então não deveriam ter acesso a benefício.”

O BPC (Benefício de Prestação Continuada) é a garantia de um salário mínimo por mês a idosos com 65 anos ou mais e também às pessoas com deficiência. No caso da pessoa com deficiência, esta condição tem de ser capaz de lhe causar impedimentos de natureza física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo (com efeitos por pelo menos 2 anos), que a impossibilite de participar de forma plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com as demais pessoas. Também é pré-requisito para receber os BPC que a renda familiar per capita seja menor ou igual a ¼(um quarto) do salário mínimo.

Ela continua e nos fala sobre as barreiras que estão sendo colocadas pelos peritos médicos do INSS:

“A gente tem motivos diversos e, ao longo desses anos, a gente foi tendo muitas barreiras por parte dos peritos, não todos, obviamente que eu preciso dizer que não são todos, e que vão trazendo com relação ao BPC. A questão do RG não é a primeira vez que a gente se depara com isso. Esse assunto é recorrente, a gente tem um grupo de peritos que trazia essa polêmica. Eles pegam uma situação isolada para criminalizar todas as crianças com deficiência do Brasil e dizer que se elas não tiverem RG elas podem ser um cidadão que está tentando fraudar a instituição (INSS)“.

Segundo nossa fonte esse problema está acontecendo por todo o país e há uma grande dificuldade para se conseguir a emissão do RG para crianças menores de 3 anos.

Nossa fonte fala mais sobre as condições das famílias e a intervenção das procuradorias no passado:

“Crianças com deficiência, de famílias com renda inferior a um quarto de salário mínimo, famílias que estão em insegurança alimentar e em situações de risco social. Esse assunto sempre foi e voltou. Na época (2017), como os peritos médicos estavam submetidos ao regramento institucional, precisou que as procuradorias se manifestassem para frear a perícia e dizer: ‘Olha vocês não podem fazer isso, porque vocês não tem legalidade para isso, para negar um atendimento’. Menores de 16 anos não são obrigados por lei a ter RG e a exigência do documento, até para bebês, está causando muitos transtornos.”

“Saiu esse documento da perícia médica que começou a dar repercussão desde ontem (21/07/2022) dizendo que não vai ter perícia médica se as crianças, os menores e adolescentes menores de 16 anos não estiverem devidamente identificado com o RG.”

Ela conclui narrando a indignação que a nova portaria causa nos funcionários e familiares das crianças que têm sua avaliação recusada:

“Acho que basicamente isso já é algo que nos indigna muito. A gente se coloca no lugar dessas família, eu falo enquanto servidor dessa instituição. A gente sabe que a ausência de servidores que a gente tem, o sucateamento da própria instituição (o INSS), a falta de concurso público que a gente vem sinalizando há anos, que já deveria ter acontecido e isso tem feito a gente não prestar para a população o serviço que a gente gostaria. A gente reconhece que os atendimentos estão demorados, a gente reconhece que estamos com um número de represamentos altos e é quando a gente se depara com algumas barreiras que poderiam ser evitadas, que a gente poderia evitar que as famílias passassem por isso. Afinal de contas a gente tem documentos que têm um poder muito maior do que aquele documento da perícia médica, a gente tem um decreto presidencial dizendo que isso é ilegal, que não pode fazer isso. Mesmo que as famílias procurem o Ministério Público e isso venha a frear a perícia médica novamente, famílias já foram lesadas. Pessoas já tiveram seu atendimento recusado. Já tiveram seu atendimento reagendado lá para a frente. Isso, se mudar na semana que vem essas famílias não vão ser atendidas na semana que vem, porque não vai ter vagas para elas na semana que vem. Elas já perderam o atendimento delas e vão ter que esperar o próximo dia que vai ter vaga para elas. A gente está falando de crianças, enquanto a gente deveria estar tomando atitudes para protegê-las, conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente”.

Nós entramos em contato com a ANMP através de suas redes sociais para se pronunciarem, mas até a publicação dessa reportagem eles não haviam respondido, mas assim que responderem publicaremos aqui a resposta.

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